A ENGENHARIA DO VÔMITO
Dizer que eu desejo mudar nunca vai ser 100% verdade. No dia
que eu repudiar 100% meu vício, logo, não há vício. A doença consiste justamente em
desejar o objeto do vício, então como posso dizer que não quero justamente o
que quero? Posso dizer, sim, que existem no mínimo duas de mim dentro de mim. E
elas brigam muito.
Lembro de uma vez que minha mãe captou uma evidência de que
eu tinha vacilado, e falou: “eu não entendo! Quem está doente, pede ajuda! Não
fica escondendo que está doente!”. Então meu pai explicou pra ela: “mas não é
uma doença involuntária e física como câncer, é uma dependência como
alcoolismo!”. Brilhantes, eles.
Mas sempre tentei mudar, mesmo não querendo totalmente. E na
falta de uma cura total, eu procurei táticas que pelo menos diminuiriam meus
ataques, e adiariam o colapso da minha saúde.
Essas táticas, eu dividi em três tipos:
TÁTICA DO “VÍCIO SUBSTITUTO”: já cheguei pensar que se, por
algum motivo, meu cérebrozinho precisa ter um comportamento compulsivo, talvez
eu pudesse apenas substituir o foco da obsessão por outro menos danoso.
Imaginem que maravilha: agora sou viciada em estudar francês!
1-
Bulimia <- por -> MÚSICA. Nos primeiros
meses em que eu estudei violão, em vez de eu chegar em casa e ir direto para a
cozinha, eu chegava e subia direto para pegar meu violão. Tocar era aquele
momento que não se quer que acabe, momento tão raro. Talvez
eu sempre tive esse lado músico meio frustrado... sufocado pela minha
consciência intransigente sempre me reprovando por qualquer coisa que não fosse
estudo-diploma-pé-no-chão-atitude-de-mulher-mãe. Já fiz alguns bicos quase
insignificantes na área, e em um desses briguei com o secretário de desporto e
cultura e dono do melhor estúdio de gravação da cidade, em uma situação que eu
poderia contornar com mais jogo de cintura. Não sou de brigar, mas no fundo
devo ter feito isso pra provar pra mim mesma que não preciso de música, de tanto
que preciso. Sobre essa frustração na música, a medida que fico mais madura e
amistosa, vamos ver até quando as oportunidades param de me fugir, pois elas
estão sempre surgindo ;). Sobre o violão, que era um consolo melhor que a
comida, não entendo por que um refúgio simplesmente perde a eficácia,enquanto
no outro refúgio eu me afundo mais e mais. Enfim, não dá certo.
2-
Bulimia <- por -> SEXO. Como manter esse
vício sem detonar minha reputação? Encontrando um outro viciado. Apenas um. E eu escolhi a dedo. A dedo podre. Tinha que
ser do tipo de cara que se apaixona por mim, pra querer minha figurinha
repetida dia após dia. Geralmente são os caras com uma pitada de malandragem,
não sei por que. Tinha que ser alguém sem nenhuma qualidade além de ser bom de
cama, pois, no caso de ele se apaixonar demais, eu não teria dó. Teria que ser
vagabundo, para estar disponível em qualquer uma das brechas do meu tempo
contado. E teria que morar em um raio de 100m da minha casa. Dez minutos de busca
no orkut e eu escolhi o Gigante. Eu estava há 2 anos sem sexo por causa da
maternidade, então, chegando lá, praticamente falei Oi já tirando a roupa. Isso foi em 2009,
e durou muitos anos, o mesmo esquema. Era segunda-feira na primeira hora da tarde ou terça-feira de manhã, sem cerimônia. Quando a minha “Esperança” era bebê, eu cuidava
do sono dela pela webcam do MSN dele. Qualquer coisa, eu estava em casa em alguns
segundos. O maior resultado dessa história foi uma grande amizade. Hoje, tenho
por ele um amor de irmão. O que terminou com a minha
ilusão ninfomaníaca foi meu namoro (com uma outra pessoa). Ele me podou os instintos
até me fazer ver que, na verdade, sou bem normalzinha, e por mais que seja
MUITO bom ver aquele macho rudimentar em cima de você com cara de predador...
sopa de bolacha Maria com leite é melhor ainda. Sempre é. Não dá certo.
3-
Bulimia <- por -> POR FAVOR, OUTRO VÍCIO!
ALGUÉM?? SERIADOS, FACEBOOK, LIMPAR A COZINHA, ESPREMER ESPINHAS, QUE SEJA!!!
Com esses, eu aprendi uma coisa muito importante: a tendência não é que um
vício elimine o outro, é que ele apenas acrescente. Nesse caso, o problema é
que DÁ certo.
A conclusão é que eu não sei falar francês assim
como ninguém se vicia em legumes.
TÁTICA DA “CIRCUNSTÂNCIA DIFICULTADORA”: existem algumas
situações que, entre outras vantagens, evitam naturalmente as crises.
1-
VIAGEM. Eu havia falado em clínica de
recuperação ou SPA, mas viagens funcionam muito bem quando são dinâmicas e
curtas. Porque se eu sentir que já estou morando lá, aí a inimiga Mia fica se
sentindo em casa também. Quando fiquei 20 dias na Itália, tive apenas uma crise,
pois eu tinha muitas colegas de quarto e sempre tinha companhia para as
refeições. Todas as meninas engordaram, e só eu emagreci. Me alimentei de fascínio.
2-
TIGHT LACING. Usar Corset reforçado com
barbatanas de aço por longos períodos para diminuir a cintura. Logo que provei,
eu vi que me esmagava tanto que eu conseguiria comer muito pouco, e não
conseguiria me curvar se eu tentasse vomitar. Usei durante 3 meses, 6 horas por
dia. Sentia fraqueza nas pernas (má circulação), pressão nos olhos, palpitações
no peito, dor nas costas, tinha apnéia durante o sono, e estava sempre apática
e tossindo. Mas não era tão ruim assim. Como não obtive nenhum resultado,
parei. Agora só uso pra bonito. Não valeria a pena usar por anos, a troco de
tão pouco resultado. A imagem não é um Antes e Depois. São apenas minhas
variações jogadas ali: mais bronzeada, menos bronzeada, contraindo, relaxada,
uns 2kg de diferença... coloquei a foto da esquerda para mostrar a realidade
crua e cruel. hahhahahahhaa Pelo menos não sou obesa, mas ainda assim é lamentável olhar essa
barriguinha larga... e sobre a dificuldade circunstancial... Não dá certo. Eu ainda
tinha umas 10 horas do dia pra encher a barriga e depois “me curvar”.
A conclusão é que eu como e vomito até acorrentada e jogada
num poço. Nem a cirurgia do siso, com seus pontos, dores e infecções me impediu
de abrir a boca pra vomitar.
TÁTICA DA “PAIXÃO INCENTIVADORA”: algumas metas nos fazem
querer estar bem pra conseguir evoluir pra ontem!
1-
ESPORTES. Eu faço há 7 anos sem parar. Preciso de
desafios e coisas novas. Já experimentei boxe, muay thai, tecido acrobático,
pole dance,street dance, dança do ventre, natação, vôlei, e todas as aulas
experimentais da cidade. A última febre foi a corrida. Cheguei a 16km de
distância, e na última competição, fiz 10km em 45 minutos, com 3 meses de
treino. Quando estou em clima de ultrapassar limites, a bulimia é só um
mosquitinho que me atrasa. O problema é quando resolvo vomitar o café da manhã,
vomitar o almoço, correr 15km no sol das 13h, e ainda assim não me sinto cansada.
Daí já não sei mais nada. A foto abaixo eu tirei do suor (formando uma borboleta)
no chão da sala de ginástica de uma das academias que eu fui. O suor do rosto é
um caminho para a liberdade.
2-
NUTRIÇÃO. O acompanhamento de um profissional
sempre dá um gás para evoluir na dieta. É até engraçado pagar para alguém te
dar diretrizes que você nunca vai seguir, mas nunca é completamente em vão. A dieta
te dá segurança. Às vezes achamos que por 4 fatias de pão estamos em total
decadência, sendo que aquela é a quantia que precisamos. Em outro post vou
colar minhas dietas e comentar as dicas e o efeito psicológico delas.
To até desanimada pra finalizar esse post. A conclusão é que não tem conclusão. Nada deu certo.
Vou continuar me apaixonando pra diminuir as crises... E vou ser livre.
a
É o problmea de qualquer vício, é bom, é válvula de escape, já adaptou na rotina. Acho que pra se libertar dele voce precisa odiá-lo, desprezá-lo e querer parar. E discordo que isso seja todo a cura, isso é só 50%. O restante é rearranjar a rotina, acabar com os gatilhos, driblar a depressão. Acho que você já nem lembra mais o que é sentir fome real, sem ser gula, fome mesmo, tipo fazer um jejum, lembra? Engraçado, porque é um puta negócio que me dá prazer, me faz sentir limpa, pura, elevada espiritualmente. Na hora dói, e não é fácil, e as tentações estão o tempo todo lá, mas quando você conclui é sensacional a força que você sente. Acho que do mesmo jeito que eu não entendo o prazer de uma sopa de bolacha maria você deve me achar maluca de curtir ficar em jejum. hahahhaha
ResponderExcluirnossa, o pior é que também sinto o bem estar da barriga vazia, mas não da fome forte (que eu não lembro qual a sensação), assim como vc deve curtir um gosto saboroso, mas não uma barriga estufada! ahahahha e não quis dizer q odiar o vício é a cura. não é mesmo... só quis mostrar como é incoerente esperar de um viciado o desejo 100% de ser normal...
Excluir